Pedagiômetro

26 de mai. de 2010

O homem que aniversaria duas vezes

Por Rui Albuquerque

Primeiro de abril de 2002. Ele passou manhã e tarde numa reunião sobre planejamento estratégico no PT (Partido dos Trabalhadores) em Sorocaba. Depois, foi curtir os filhos. Estava sentado no sofá vendo televisão quando apagou. Acordou no hospital Albert Einstein em São Paulo. Havia sofrido um acidente vascular cerebral hemorrágico. Foi operado pelo dr. Marcos Stavalli, que havia regressado naquela semana dos Estados Unidos, onde se especializara em cirurgias cerebrais. E recebeu uma boa notícia: “Deputado Hamilton Pereira, o que aconteceu foi um milagre. Acidentes como esse geralmente causam a morte, mas o senhor se recuperará e terá vida plena. Lembre-se em comemorar seu aniversário em mais uma data: 2 de abril, o dia em que o senhor renasceu”.
Hamilton Pereira, deputado estadual, vai comemorar 56 anos no próximo dia 8 de julho. Comenta feliz o dia em que recebeu o “grande milagre”. Quando acordou, estavam ao seu redor os deputados médicos Roberto Gouveia, do PT e Valter Feldmann, do PSDB, além da equipe médica do doutor Stavalli. Nela, um sorocabano, o dr. Francisco Carlos de Andrade Filho.
(Abro parêntesis aqui: Francisco é filho do cardiologista Francisco Carlos de Andrade, que Sorocaba conhece como doutor Neto ou Netinho. Desde que nasceu era chamado de Neto pela família. “Há alguns anos, acrescentou em cartório o Neto em seu nome até por questão de marketing”, lembra o amigo Nilson Costa, dentista e humorista. Nilson entrou no jardim de infância aos 3 anos, junto com Neto. Sempre foram ligados. E brinca: “O Neto foi grande pivô no basquetebol sorocabano e tinha o apelido de Fuminho. Ele nunca fumou maconha, mas era moreninho... O seu irmão caçula, Marco Antonio de Andrade, médico ortopedista e grande atleta na juventude, ganhou o apelido de Furacão porque era um baixinho agitado, que deixava os adversários vendo brisa...”)
Voltando ao Hamilton, ele mora há anos num pequeno condomínio do Jardim São Guilherme. Não tinha posses para arcar com o custo do “Albert Einstein”: R$ 100 mil. Porém, os líderes dos partidos na Assembleia Legislativa se reuniram e pediram aos 94 deputados que autorizassem o desconto de 50 reais mensais, durante doze meses, em seus salários para ajudar o pagamento. 88 aderiram. Ainda, Luiz Inácio Lula da Silva veio a Sorocaba para participar de um jantar pró Hamilton Pereira, no Sorocaba Park Hotel, com adesão de mil reais por pessoa. Assim a conta foi paga.
Aí é que entra o melhor da história: Hamilton Pereira sempre foi combativo e, na Assembleia Legislativa, alguns debates pegam fogo. Muitos parlamentares chegam a se tornar inimigos, devido troca de ofensas. Como atuante do PT, ele viveu momentos de tensão com vários adversários. Ao voltar à Assembleia, ocupou a tribuna e falou sobre humildade, gratidão e amor. Agradeceu o companheirismo demonstrado por todos e chegou a derramar lágrimas pelo gesto generoso recebido, “acima de divergências pontuais ou interesses partidários”. Quanto terminou o discurso, os deputados se levantaram e o aplaudiram longamente. Foi momento marcante e inesquecível naquela casa de leis.
Passagens assim raramente são contadas pela imprensa, mesmo reportando o que existe de melhor no ser humano. Eu gosto de lembrá-las, pois todos vivemos momentos fantásticos e que tornam a vida deliciosa, valorizada, apaixonante. Conhecendo-as, aumentamos nossa confiança nas pessoas e acreditamos num futuro sempre melhor.

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Belo texto esse do Rui. (artigo publicado no Jornal Bom Dia - Sorocaba - dia 26/05/2010)

2 comentários:

  1. pois é... se o governo ao inves de investir em si mesmos deveriam investir em hospitais publicos de qualidade... pra que não hajam problamas como este! tem coisas que são ridiculas de se ler cá pra nós.... ainda apelando pro sentimentalismo!

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  2. Pois é, "Anônimo", creio mesmo que os investimentos em saúde ainda estão muito abaixo do necessário.
    Esse debate é duro e exige que coloquemos de lado certos preconceitos e dogmas.
    Agora, o texto do Rui não é um apelo sentimentalista. Até porquê, ele é sabidamente detém uma preferência partidária que não a minha. Participou, inclusive, da campanha de Vitor Lippi.
    No entanto, essas nossas diferenças tão pouco o impedem de justamente homenagear os que merecem, quanto a mim de prestigiá-lo como competente jornalista.
    Creio que o sentimentalismo está muito abaixo desse tipo de relação. Trata-se de respeito.

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